TEU ROSTO NO ESCURO
Há tempo busco teu rosto, Senhor,
mas nunca o encontrei;
qualquer raio de tua luz, talvez,
efêmero, fugaz, instantâneo;
jamais um rosto conhecido,
ao qual abrir o coração...
Sigo em busca de teu rosto, Senhor,
mesmo sabendo de não o encontrar;
noite e dia, sem cessar,
feito cego em meio ao deserto,
rastejando inseguro os pés,
tateando incerto com as mãos...
Apesar de tudo, Senhor,
num misto de inquietude e esperança,
sempre buscarei teu rosto:
nestes mares de águas bravias,
ele me acende um farol,
me aponta o rumo do porto,
me oferece uma bússola,
me abre um novo horizonte...
Não, não conheço os contornos
de teu rosto luminoso, Senhor,
não sei onde ele se esconde:
pode estar na beleza da flor,
na espiga que forma o grão,
na algazarra do pássaro matutino,
na brisa que acaricia minha face,
no vento veloz que passa,
no canto límpido das águas,
no riso solto das crianças,
no saber acumulado pelos anos,
no brilho do olhar dos que amam,
no sol que ilumina e aquece,
no céu azul e no ar fresco,
na infinitude dos oceanos,
na noite que convida ao repouso...
Ou na face desfigurada do irmão,
no rio de gente que aflita corre,
na multidão sem rumo,
na alucinação do jovem drogado,
na jovem seminua à cata de freguês,
no homem sujo e solitário
que do lixo garimpa o que comer,
na família sob uma lona debaixo de minha janela...
Onde está teu rosto, Senhor?
Ao mesmo tempo,
te aproximas e te ocultas,
és fonte de água e de sede,
estás perto e estás longe;
mas sei que, em silêncio,
segues meus passos irrequietos,
acompanhas minha travessia,
comigo, mudo, caminhas!
Pe. Alfredo, SP, 17/09/2024
Foto: freepik
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